quarta-feira, 24 de outubro de 2012

‎"Sabe a mania das pessoas de comparar sentimentos a coisas? Ultimamente, tenho ouvido muito sobre o amor como um mar. Às vezes calmo, sereno. Às vezes tempestuoso, cheio de perigos, mas depois vem a calmaria. Mas, pra variar, o amor que eu sinto não é como um mar. Não é nem como um rio, que corre e escoa no mar. É um amor contido, devagarinho, seguro mas cheio de buracos incertos no fundo. Esse amor tipo água de represa. Esse amor que não está pra valsa, não está pra samba, não está pra nenhuma opereta. Está pra canções compostas com sonetos de Camões, está pra uma letra de um escritor sofrido e para a voz de um cantor contido. Faça meus os versos de um certo “monte castelo”, onde se dizia que o amor é um fogo que arde sem se ver."
Alguém.
"Tira essas correntes imaginárias dos pés, menina. Desfaz os elos e sonha. Mas sonha alto, que é pra dar impulso pro teu salto."
"Que a vida seja uma literatura. Que seja repleta de poesia e de contos de fadas. Que haja o romance, mas que a aventura não deixe nada virar rotina. Que tenha um certo suspense pra não ter momentos previsíveis. Que o terror dê as caras de vez em quando, pra fazer subir os batimentos. Que não deixe de haver comédia, pois ninguém vive sem rir um pouco. Que tenha ficção, por que às vezes a realidade enjoa. Mas que acima de tudo, seja uma biografia. Uma biografia cheia de exclamações e reticências, cheia de nomes e lugares, cheia de sorrisos e de lágrimas. Mas que seja só sua."
Alguém.
"E se for pra acontecer vai ser assim. Vai ser sem aviso, vai ser do nada, vai ser de surpresa, vai ser de tirar o ar, vai ser de deixar sem fôlego. Se for pra ser vai ter fogo, vai ter gelo, vai ter raio, vai ter gente em estado de choque. Vai ter gente gritando, gente rindo, gente chorando, gente lutando, gente fugindo. Vai ter gente só assistindo, sentada num lugar alto e admirando como a uma obra de arte. Vai ter gente. Por que em tudo tem gente! Por que gente, tem tudo! Gente tem alegria, tem tristeza, tem riso, tem lágrima, tem grito e tem silêncio. E se for pra ser, que seja assim. Com muita gente. Com gente que tem de tudo. Com todo tipo de gente. Por que tudo na vida é desse jeito. Você nasce, você cresce, você aparece, você erra, você acerta, cai, chora, levanta e ri. Um dia você morre. E se você parar pra pensar, o que há de comum nisso tudo é uma coisa só. Gente."
Alguém.
‎"As pessoas são profundas, sabe? São todas como poços. E esses poços vão mudando com o tempo. O que você vê é o topo, é o final do poço, na verdade. As paredes no caminho para a base, são tudo que as pessoas usam para esconder que sentem e vivem. Cada pedra nessas paredes, é um aprendizado, uma lembrança. Lá no fundo, que na verdade não é fim, é começo, estão os sentimentos. É ali que fica a natureza da pessoa, o lado selvagem, quase animalesco, os instintos, as vontades mais escondidas. Mas a maioria das pessoas é um poço sem balde, sem corda. Você pode conseguir um balde e tirar um pouco daquela água, depois o balde volta pra você e você a tornou um pouco mais vazia. Você pode pegar apenas a corda e descer até lá, se assustar e admirar com toda a profundidade daquele poço e acrscentar coisas. Desenhe nas paredes, grite e faça eco, não importa. Todo poço foi feito pra ter marcas, pra mudar e melhorar, ficar mais resistente, mas não pra se tornar seco, sem água, sem alma."
Alguém.
"Toda alma quando nasce é assim, um comodo gigante, sem forma, cheio de cantos, cheio de frestas. Aos poucos você vai colocando vida ali. Vai mobiliando. Vai decorando. Vai conseguindo ajuda pra mudar algumas coisas. “Sabe, uma janela aqui ficaria bom”, “Que tal uma porta?”, “Espandir é uma boa”, “Essa parede ficaria linda salmão”. Mas nunca está terminado. Um dia você se senta numa poltrona qualquer que você deixou no meio desse cômodo, olha pra um quadro, um vaso e pensa “já é hora disso sair daí, já é hora de algo novo entrar”. E você abre a janela e atira isso pra longe, por que estava estragando o lugar. E então você vê que aquilo não era tão ruim, abre a porta e decide sair e retomar, talvez tenha concerto. Você não cuidou do lado de fora. O mato está alto, tem lixo acumulado, você cortou os pés descalços num caco de vidro. Agora você usa sapatos sempre que tem que sair. Agora você pensa antes de jogar algo pela janela. Agora você tenta controlar quem anda em volta do teu cômodo, da tua alma. Agora você expandiu sua morada. Fica maior com o tempo. Você faz ligações com outra almas, constrói pontes e as derruba, todos os dias. Por que toda alma é assim, um cômodo gigante."
Alguém.
‎"E ela é uma criança novamente. Pelo menos, é assim que se sente. Corre livre, corre lindo, corre como só havia corrido em sonhos. Um campo, imenso, cheio de flores, as suas preferidas. Não sabia nem seus nomes, mas eram suas preferidas. Nomes só servem pra estragar as coisas. A magia está em criar, na sinestesia da pétala de cada flor roçando na pele de suas pernas. E ela corre livre. Pisando em pedaços de gravetos, restos de espinhos.Mas nada disso a fere. A imensidão do ar e do mar de flores compensa."
Alguém.
"As pessoas usam tanto a palavra ‘amor’ que virou algo comum demais. Algo sem valor algum. Sim, o amor perdeu o seu valor, o sentimento mais puro está se perdendo. Amor é algo tão forte, tão mágico, tão diferente de tudo que você nunca vai sentir o mesmo amor que os outros. O amor é algo pessoal, único, como uma marca de nascença ou algo assim. É como ouvi uma vez de uma certa senhora cujo nome não me lembro, mas era de fato muito sábia. Ela me disse que duas pessoas nunca se olham como mesmo amor. Não ao mesmo tempo. É impossível por que daca um ama do seu jeito e esse amor muda a cada segundo. Hora é mais intenso, quase uma paixão dessas de estourar o peito. Hora é calmo, é cheio de riso, como uma amizade benfeita. Enfim, não vou tentar explicar o que é o amor. O que é pra mim, não é pra ninguém mais. Eu amo do meu jeito louco, bobo, espalhafatoso, fechado e todo meu. Do meu jeito. E pronto."
Alguém.
"Tenta. Não sei muito bem o quê, mas tenta. Vai valer a pena no final. Você vai ver. Luta, só mais um pouco, não se abate, não se deixa vencer. Não dê a luta por perdida antes mesmo dela começar. Vai, corre, se esconde, espera, mas não foge, não desiste. Ainda há muito pelo que vale a pena correr. Só não vale a pena esse teu jeito de que a qualquer momento posso ir até a tua casa e tua mãe vir me atender com os olhos de quem chorou tanto que as lágrimas secaram. Faça qualquer coisa! Se jogue, cometa erros, resolva problemas, ou não. Só te peço que faça uma coisa por mim. Uma única coisa. Não desiste."
— Ergue a cabeça e segue em frente, meu amigo.
Alguém.
"Eu sou meio que um rascunho. Não. Sou um meio rascunho. Inacabado, todo errado, faltando uns verbos e uns pronomes. Carrego nas minhas linhas, palavras que nunca deveriam ter sido escritas. Sim, sou um meio rascunho. Não se preocuparam em me terminar e ver no que ia dar. Pararam na metade, amassaram minha folha e jogaram no chão. As pessoas passam e não me veem. Pisam, chutam, ignoram. Talvez um dia alguém puro e doce como uma criança veja esse pedaço de papel amassado, errante e o pegue nas mãos, o abra e comece a ler. Talvez goste do que leu e tente consertar um pouquinho aqui e ali. No fundo eu sei que fui eu quem me escreveu, largou e jogou fora. E no fundo espero poder me tornar, um dia, essa criança que vai dar cor e vida, e novas palavras, a esta folha de papel amassado."
Alguém.
"Ele disse que conhecia uma pessoa ingênua. Ingênua de acreditar num mundo de fadas e beleza . Ingênua de se trancar nesse mundo e deixar que os outros a utrapassassem do lado de fora. “Eu conheci uma pessoa ingênua”, ele disse e continuou, “e que pensava que tudo era como um mundo de fadas; foi difícil, mas consegui trazê-la deste inferno”. Eu entendia a parte de ingenuidade. Entendia que alguém se trancasse num mundo de fadas e que aquilo podia ser uma espécie de inferno pessoal. Mas eu nao entendia como se tirava alguém disso. A pessoa cria sua própria jaula, à prova de balas, e se tranca lá. Uma proteção, uma armadilha. Fiquei imaginando como seria alguém se atrever a entrar nessa jaula gigante, de fadas-demônios e desbravar aquele paraíso-inferno atrás de uma pequena criança perdida, iludida ali dentro, enfeitiçada pelo macabro mas agradável canto das fadas. Seria possível? Ele era a prova de que sim. Era possível entrar num mundo cmpletamente criado por outra pessoa e arrastá-la porta afora. Mas mundos são poderosos. E mentes também. Nos pregam peças, brincam conosco. Com nossos corpos, com nossos rostos. Ah, todos podemos ser um pouco daquela pequena pessoa ingênua."
  — Um paraíso das fadas, um covil de demônios. O que nossa mente não poderia criar?
Alguém, agradecimentos a Leo Dante, o desbravador de mundos invisíveis.
"Ah, mais uma tarde que se passa. Mais uma tarde sentada nesses degraus de varanda. Mais um chá. Maçã com canela, hoje. Talvez seja meu preferido. Talvez eu gosta mais de camomila. Ou de cidreira. Mas isso não importa tanto. Aliás, não sei bem o que mais me importa. O mundo tem girado muito rápido. Digo, devagar. Ou talvez nem sequer tenha saído do lugar. Talvez apenas minha cabeça esteja girando, minhas ideias, minhas confusões. Estou confusa. Ou não. Minha máquina de escrever está emperrando, mas sempre esqueço de comprar o óleo de que ela tanto precisa. Gosto dela, é minha mais velha amiga. Talvez não seja tão velha assim, admito. Mas tem história essa pequena e pesada caixinha de escritas. Meus velhos amigos já não são mais os mesmos. Por Deus, eles continuam lá, no mesmo lugar! Eles continuam com suas segundas e terceiras esposas absurdamente jovens, louras e bronzeadas, e com seus filhos, seus enteados. Elas continuam com os velhos ricos que ainda não tiveram um infarto ou ainda não rolaram de uma escada em caracol. E eu continuo aqui. Sentada numa escada de varanda. É uma bela varanda, bela casa também. Mas os cupins não a perdoam por ser bonita. Ah, não a perdoam mesmo. Continuo sozinha, com meus cigarros, meu chá e minha máquina de escrever. Sinto que estou enlouquecendo! As pessoas que me faziam bem, agora me tratam à distância. Como se eu tivesse algo contagioso e eles apenas tivessem pena da minha desgraçada. Mas não estou desgraçada, eu acho."
Alguém.
"Se tudo tem que terminar um dia, que acabe de forma grande. Que não aja contenções ou meias palavras. Que as ofensas e despedidas e palavras de esperança e atos finais, sejam memoráveis. Que os términos sejam dignos de uma obra Shakesperiana, repleta de exageros, atrocidades e hipérboles. Sou conta finais pacatos. São coisinhas frias e superficiais, cheias de meias verdades, de meias palavras, de meias pessoas. Tive alguns finais assim na minha vida e são as únicas coisas das quais me arrependo. Dão a impressão de que aquilo talvez não devesse acabar. Quando deve terminar mesmo, fica marcado… Finais pacatos não marcam, não mordem, não sangram. Não surpreendem, não ferem, não arrancam risos no futuro. Ah, se pudesse voltar no tempo… Ah sim… Sim, sim, sim. Talvez mudasse isso. Mas agora o que resta é escrever e tomar chá, sentada numa varanda, vendo o tempo correr ao meu redor. E torcer para que meu final não seja pacato como o ar que me circula."
Alguém.
"Meu primeiro fim de tarde na casa nova. Vesti meu roupão, peguei minha xícara de chá e fui para os fundos da casa. A varanda era mesmo linda, e virada pra oeste, então minha visão desse pôr-do-Sol foi a mais perfeita possível. Fiquei ali, apoiada nas pilastras de sustentação da casa. Aquele cheiro podia ser o bastante pra me desligar do mundo... Meu chá, madeira, a terra meio molhada da chuva que começava a cair. Oh céus, isso tudo era tão perfeito! Ele tinha que me vir à mente outra vez e acabar com o meu momento. Por tudo que é mais sagrado, eu precisava esquecer daquilo. Ele estava em paz agora, sei que estava. Foi um adeus difícil, doloroso. Mais pra mim do que pra ele, é uma fato. Doeu demais ter que ser aquela que fecharia seus olhos, meu amor. Eu apertei sua mão tão forte quando vi seus olhos perderem o brilho, que senti que iria quebrá-la. Mas já faziam cinco anos, já era tempo de esquecer isso."
Alguém.